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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

terça-feira, 10 de junho de 2014

Artigo: Aprenda a “enxergar” desperdícios na gestão hospitalar

*Por Flávio Battaglia

Filosofia de gestão inspirada nas práticas e resultados do modelo Toyota, o sistema lean é atualmente adotado com grande sucesso por empresas de praticamente todos os setores, inclusive na área saúde. Os casos mais avançados encontram-se nos EUA, no Reino Unido e na Austrália. No Brasil, já existem casos consolidados, mas ainda restritos a determinados centros de excelência. O assunto ainda é novidade para a maioria dos profissionais da área e o interesse parece ser crescente.

Em essência, o objetivo da aplicação dessa filosofia na gestão hospitalar é o mesmo que já se conseguiu na manufatura e em outros setores: a busca contínua pela eliminação de atividades desnecessárias, os desperdícios, que só elevam custos, deixam o negócio menos competitivo e prejudicam a qualidade.

Principalmente no Brasil, trata-se de uma ideia das mais necessárias, pois sabemos o quão carente é nossa estrutura de saúde pública ou mesmo complementar, onde não é difícil encontrar custos impraticáveis e qualidade inadequada.

Essa mentalidade “enxuta” parece ser uma necessidade para a maior parte dos hospitais brasileiros, que ainda possuem premissas de gestão “tradicionais”, e onde se encontra enorme potencial para a eliminação de diversas formas de desperdícios – para deixar de fazer o que é irrelevante, liberando capacidade para aprimorar aquilo que realmente interessa: a segurança do paciente e a qualidade do cuidado.

Para implementar o sistema lean na área da saúde, o primeiro passo é “aprender a enxergar”. Em outras palavras, saber visualizar as atividades e etapas que não criam valor para o paciente e que, portanto, poderiam ser caracterizadas como desperdício. Assim, é fundamental conseguir distinguir as etapas que criam valor daquelas que não criam (e devem ser eliminadas), dentro das rotinas de um hospital.

Para tanto, é preciso ir às origens do sistema lean. No livro “O Sistema Toyota de Produção” (1997), Taiichi Ohno, um dos responsáveis pelo desenvolvimento do modelo de gestão da montadora japonesa, categorizou os principais desperdícios que podem ser encontrados num processo produtivo. São eles: retrabalho, espera, movimentação, transporte, estoque, excesso de processamento e desconexão. Podemos considerar ainda um oitavo, o desperdício de conhecimento e talento humano. Cada um desses desperdícios pode ser encontrado em abundância também na área da saúde.

Por exemplo, as “filas de esperas”, facilmente detectadas em qualquer ambiente hospitalar, podem ser minimizadas por mudanças de gestão, como melhor adequação das agendas de médicos e equipes, de fluxos e layout mais eficientes, de formas de atendimentos mais ágeis, de categorizações por diferentes tipos de pacientes, entre outras ações.

Ou ainda os desperdícios gerados por movimentações desnecessárias, que frequentemente ocorrem no ambiente hospitalar: para buscar materiais em almoxarifados distantes, levar de volta o que sobrou, transportar equipamentos, procurar exames etc.

Para isso, há uma série de técnicas lean de gestão que podem eliminar ou minimizar tais movimentações e estoques desnecessários. Por exemplo, os chamados “dispositivos kanban”, sinalizadores que autorizam e dão instruções para a produção ou para a retirada de itens, o que torna a movimentação de materiais mais precisa e ordenada. Ou, então, a adoção do “fluxo em pequenos lotes”, que deixa torna o processo mais adequado à demanda, evitando o acúmulo de estoques, esperas e retrabalhos.

Claro que não é fácil enxegar esses desperdícios na gestão hospitalar, até porque boa parte deles permanece “escondida” em meios a processos que muitas vezes repetimos diariamente sem nos perguntamos se realmente agregam valor.

Por isso é importante utilizar outra ferramenta fundamental do sistema lean, utilizada cotidianamente por organizações que adotam o modelo: o Mapeamento do Fluxo de Valor. Trata-se de “mapas” que permitem visualizar os fluxos de pacientes, materiais e de informações em um hospital, buscando diferenciar as tarefas realmente importantes das que não tenham valor algum.

Por exemplo, é possível representar visualmente toda a “jornada do paciente”, dos materiais e das informações, necessários para se fazer um cirurgia, um exame ou uma consulta. Mapeando os processos dentro de um hospital, encontramos diversos gargalos ou etapas que podem ser melhorados, reformulados ou mesmo eliminados. Na filosofia lean, “mapear” significa entender e visualizar o “estado atual”, visando projetar um “estado futuro” melhor, que deverá ser implementado por meio dos conceitos e técnicas lean.

Conseguir “enxergar” os desperdícios, muita vezes escondidos, é um dos primeiros passos para se implementar lean em qualquer organização, inclusive hospitais. Só assim será possível entendermos onde e porque os desperdícios acontecem. Se não eliminarmos a causa, o efeito não cessará. Para isso, é preciso, primeiro, “aprender a enxergar”.

*Flávio Battaglia - Gerente de Projetos do Lean Institute Brasil. Formado em administração de empresas pela EAESP - FGV, juntou-se à equipe do Lean Institute em 1999, alguns meses após sua fundação. Participou da transformação lean em empresas de diversos setores, sendo responsável por projetos avançados e de amplo escopo em fábricas e escritórios. Nos últimos anos, tem se dedicado à aplicação do conhecimento lean por hospitais e clínicas médicas (Lean Healthcare), mantendo-se envolvido com as iniciativas pioneiras no Brasil, Europa, EUA e Austrália. Autor do prefácio para a edição em português do livro \``Uma Transformação na Saúde\``.

Fonte: Saúde Web