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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

terça-feira, 3 de março de 2009

Transferência do Custo da Responsabilidade Civil e os Laboratórios

Segundo informações do STJ (Superior Tribunal de Justiça), o número de processos envolvendo o chamado “erro médico” cresceu 17 vezes em 7 anos. Em 2001 eram 23 processos e em Outubro de 2008 eram 360.
Uma análise mais detida da informação acima permite concluir que o número de processos envolvendo “erro médico” cresceu muito mais do que 17 vezes neste século. Isso porque, o STJ é a última instância do Poder Judiciário para analisar questões não relacionadas à Constituição Federal.
Na organização do Poder Judiciário, de forma sintética, pode-se afirmar que são três esferas: Juízo Monocrático (Vara cível), Tribunal de Justiça Estadual e Superior Tribunal de Justiça. Destarte, o processo inicia-se em uma Vara Cível (Juízo Monocrático), segue ao Tribunal de Justiça Estadual e posteriormente ao STJ.
Para que um processo chegue ao STJ, o recurso apresentado (especial) deve obedecer alguns requisitos. Isto é, embora possam ser apresentados recursos das decisões proferidas pelos Tribunais Estaduais, não são todos os recursos que chegam a ser apreciados pelo STJ.
Logo, como não são todos os processos que chegam ao STJ, o aumento verificado neste Tribunal reflete apenas e tão somente parte do efetivo crescimento do número de demandas envolvendo o “erro médico”.
De outro lado, deve-se destacar que o percentual de procedência (ganho de causa pelo “paciente”) é relativamente pequeno, correspondendo a aproximadamente 20% (vinte por cento). Ou seja, 80% (oitenta por cento) das ações envolvendo “erro médico” são julgadas improcedentes.
Porém, o que pode parecer ser um ganho para os processados, na realidade mostra-se perda, na medida em que a defesa em um processo judicial representa custo para o demandado, conforme abaixo se expõe.
Isso se deve, principalmente, ao fato de que o “paciente” ingressa com a ação judicial e pleiteia os benefícios da justiça gratuita. Uma vez concedidos estes benefícios, o autor não terá que arcar com as custas e despesas do processo, tampouco com os honorários de sucumbência, pelo menos enquanto durar a condição de “pobre”.
Somem-se a isso outros dois fatores relevantes: a fábrica do dano moral e a “propaganda” no sentido de que todos os pacientes que ingressam com ação judicial vencem (praticamente todos os dias a mídia apresenta decisões favoráveis aos pacientes e nunca – ou quase nunca – publicam matérias em que os paciente foram vencidos, embora estas sejam a maioria).
Com estes três fatores principais, o quadro está pintado: o autor não precisa pagar para processar (e se perder a ação não precisará “colocar a mão no bolso); qualquer insatisfação torna-se dano moral e não se tem notícia de que pacientes perdem ações contra prestadores de serviço na área da saúde (médicos, dentistas, hospitais, clínicas, laboratórios, etc.).
Desse modo, o autor não paga as custas de distribuição (aproximadamente 1% do valor do pedido), tampouco honorários do perito; além disso, se perder a ação (o que ocorre na grande maioria das vezes), não terá que arcar com os honorários sucumbenciais (na faixa de 10 a 20 % do valor da causa).
Ou seja, ao ser vencido em uma ação judicial, o autor simplesmente deixa de ganhar, posto que nada teve que pagar. Por seu turno, o processado, embora vencedor, terá que suportar os custos relativos às custas e despesas do processo, além de honorários advocatícios, periciais e de assistente técnico.
Portanto, claramente pode-se concluir que a simples existência de um processo judicial, independentemente da condenação, acarreta custos para o demandado.
No intuito de minimizar os custos relativos à responsabilidade civil acima apontados, o gerenciamento de riscos mostra-se conduta primordial. E, dentre as medidas contempladas pelo gerenciamento de riscos, a contratação de um seguro de responsabilidade civil profissional tem-se mostrado elemento de elevada importância.
Antes de mais nada, o que se deve ter em mente é que o seguro de responsabilidade civil profissional protege apenas e tão somente o prejuízo financeiro suportado pelo demandado em uma ação judicial. Logo, não se caracteriza como uma carta em branco para os segurados agirem de forma contrária aos preceitos éticos e doutrinários.
Como dito acima, o seguro de responsabilidade civil profissional apenas e tão somente é uma forma de transferência do custo da responsabilidade civil. Caso o segurado seja vencedor na ação que lhe foi infundadamente movida, não terá que suportar todos os prejuízos havidos por conta da demanda (custas e despesas processuais, honorários de advogado, perito e assistente técnico, etc.).
Evidentemente, o interessado em contratar o seguro de responsabilidade civil profissional deve fazê-lo de forma consciente, observando-se alguns elementos principais, conforme passaremos a indicar de forma sucinta.
O objeto do contrato deve guardar relação com danos decorrentes do exercício profissional. Uso, existência e conservação do imóvel, incêndio, roubo/furto, etc. são figuras alheias ao seguro de responsabilidade civil profissional.
A contratação pode ser feita na pessoa física ou na pessoa jurídica. No caso específico de laboratórios, a legislação faculta ao paciente o ingresso com a ação em face do médico (pessoa física) que assinou o laudo e/ou em face do laboratório (pessoa jurídica). Desse modo, o “paciente” pode processar ou o médico; ou o laboratório; ou ambos. Isto é, o laboratório poderá ser demandado por ato praticado por qualquer um dos seus prepostos.
Assim, este fator deve ser considerado pelo laboratório, ou seja, a contratação do seguro de responsabilidade civil profissional é importante, posto que o laboratório pode ser demandado por ato praticado por um de seus prepostos, arcando com todos os custos processuais acima referidos.
Ainda, deve ser observado o valor da importância segurada (valor máximo a ser pago pelo seguradora) contratada, bem como se existe previsão de franquia para o segurado.
Além desses, o interessado deve ficar atento ao tipo de cobertura, isto é, quais danos causados a terceiros estão cobertos. Isso porque, apólices de algumas seguradoras condicionam o pagamento de danos morais à existência de danos corporais ou materiais.
Este tipo de apólice não atende aos interesses dos laboratórios, na medida em que muitas vezes as ações versam sobre danos morais puros, independentemente da existência de danos materiais ou corporais. Assim, quando da contratação do seguro, a cobertura para os danos morais deve ser independente da ocorrência de qualquer outro dano.
Outrossim, o segurado deve observar os riscos excluídos e as causas de perda do direito à indenização, sendo que estas cláusulas variam de seguradora para seguradora, mas sempre guardam relação em linhas gerais, dentre outras, com prática de atos antiéticos intencionais (dolosos), atos proibidos pela legislação e defeito na informação para com a seguradora.
O segurado, ainda, deve buscar a contratação de um seguro de responsabilidade civil profissional que lhe garanta assessoria jurídica em todas as esferas possíveis de responsabilidade, a saber: cível, criminal, ética e administrativa.
Especificamente em relação aos laboratórios, há seguradoras no mercado que estendem a cobertura da pessoa jurídica para o responsável técnico. Destarte, a pessoa jurídica contrata o seguro de responsabilidade civil, mas, por força da cláusula extensiva da cobertura, os danos praticados pela pessoa física do responsável técnico também estarão cobertos pelo seguro.
Observadas as condições acima, tem-se que a contratação de um seguro de responsabilidade civil profissional é uma medida salutar e necessária para que o laboratório não se veja obrigado a suportar as despesas decorrentes de processos judiciais.
Evidentemente, a decisão de bancar os riscos e eventuais prejuízos de uma ação judicial ou de transferir os custos da responsabilidade civil cabe a cada um. O importante é que a decisão de contratar ou não o seguro seja feita de forma esclarecida.
Neste sentido, conforme já dito, o seguro não é uma carta em branco para o segurado e tampouco cobrirá o seu principal patrimônio que o nome. O seguro, repita-se, destina-se a aceitar os riscos de cobrir os custos que o segurado tiver com procedimentos relacionados ao desenvolvimento de sua atividade. Pelo bom nome, cabe ao segurado zelar.
Portanto, em conclusão, tem-se que o seguro de responsabilidade civil profissional não evita que os fatos aconteçam. Mas, se acontecerem, arca com os seus custos financeiros, protegendo o patrimônio do segurado.